Por que é tão fácil imaginar o fim do mundo? Por que todo filme sobre o futuro mostra cidades chuvosas, iluminadas por néon, governadas por corporações malignas? E por que é tão difícil, quase constrangedor, imaginar um futuro onde as coisas... deram certo?
Mark Fisher chamou isso de Realismo Capitalista: a sensação generalizada de que não existe alternativa. O sistema colonizou não apenas nossos dados, mas nossos sonhos. Ele nos convenceu de que o futuro será apenas uma versão piorada (mais vigiada, mais quente, mais cara) do presente.
A resistência final é a Imaginação Radical. É a coragem de ser otimista de uma forma técnica, punk e suja. Não é o otimismo ingênuo de que "tudo vai dar certo", mas o otimismo pragmático de quem diz: "nós vamos consertar isso".
A escritora Ursula K. Le Guin disse: "Vivemos no capitalismo. Seu poder parece inescapável. Mas assim também parecia o direito divino dos reis." Para Le Guin, a função da ficção (e da tecnologia) não é prever o futuro, mas descrever uma realidade onde as regras atuais não se aplicam, provando que elas não são leis da física, mas escolhas políticas. Imaginar um mundo sem Big Tech é o primeiro passo para construí-lo.
O Vale do Silício nos vende dois futuros: a Distopia (apocalipse climático, cada um por si) ou a Utopia Tecnocrata (Metaverso, Marte). Ambos têm algo em comum: eles negam a vida biológica e comunitária aqui na Terra.
Contra o cinza do Cyberpunk, surge o Solarpunk. O Solarpunk não rejeita a tecnologia, mas rejeita a centralização. Ele imagina um futuro onde a alta tecnologia é usada para regenerar a natureza e empoderar a comunidade, não para dominá-las.
É um futuro de cidades verdes, mas não primitivas. Painéis solares transparentes. Dirigíveis de carga. Impressoras 3D comunitárias. Internet descentralizada (como vimos no capítulo anterior) rodando em servidores locais movidos a energia eólica.
Alta Tecnologia + Alta Biologia:
O Solarpunk rejeita a nostalgia do "retorno ao campo". Nós queremos a medicina moderna e a comunicação global. Mas queremos usar a IA para otimizar a distribuição de energia de uma cooperativa solar, não para gerar anúncios. Queremos biotecnologia para limpar rios com bactérias, não para patentear sementes.
| Cyberpunk (O que nos vendem) | "High tech, low life". Corporações governam. Chuva ácida. Fuga para o VR. |
| Solarpunk (O que precisamos) | "High tech, high life". Comunidades governam. Cidades-jardim. Foco no Real. |
O algoritmo quer que você acredite que o futuro é algo que acontece com você, como um filme. O Solarpunk diz que o futuro é algo que você constrói com as mãos.
Reivindicar o futuro significa sujar as mãos. Significa aprender a consertar seu computador, a plantar sua comida (mesmo que seja manjericão na janela), a configurar seu servidor no Fediverso. A utopia não é um lugar onde chegamos; é uma ferramenta que usamos para quebrar o concreto do presente.
A Engenharia da Esperança
O cinismo é a ferramenta do status quo. A esperança é rebelde.
Sua missão: Escreva um parágrafo (no seu caderno analógico) descrevendo um dia na sua vida daqui a 10 anos, num mundo onde a tecnologia deu certo. Como é o seu trabalho? Como é o ar? Como você se conecta com os outros sem ser vigiado?
Esse parágrafo é o código-fonte da sua resistência. Não o perca.